Em agosto de 2019 fui com um grupo de earlybirds ao Quénia, onde fizemos voluntariado no Limuru Children’s Centre (https://limuruchildrencentre.org/), um centro de acolhimento de crianças em risco. O centro inclui uma casa que acolhe e cuida de bebés abandonados pelas mães, que ali ficam enquanto decorrem os processos de adoção.

Durante a nossa permanência em Limuru estivemos na casa dos bebés todos os dias e os earlybirds foram incansáveis (e muito entusiasmados) na ajuda que deram às cuidadoras: brincaram, alimentaram, embalaram, vestiram e, sobretudo, deram muito colo a todos os bebés.

Desde o primeiro dia fui surpreendida por uma constante na indumentária dos bebés: todos tinham as meias desemparelhadas! Meias de todas as cores e feitios conviviam alegremente entre si nos pés dos bebés.

A contemplação desses pés coloridos fascinava-me e fazia-me pensar. Era absolutamente óbvia a desnecessidade de as meias estarem emparelhadas, por pelo menos três razões: 1) as poucas mãos que se dedicavam a cuidar dos bebés dia e noite tinham coisas bem mais importantes para fazer do que emparelhar meias; 2) os bebés queriam era colo e pés quentes e era-lhes totalmente indiferente a cor das meias; 3) num sítio onde os recursos eram escassos e toda a roupa doada, a filosofia só podia ser a de desperdício zero, pelo que nenhuma meia era deitada fora por ninguém saber do seu par.

E de repente, um pequeno detalhe de vestuário pôs-me a pensar sobre prioridades, sobre a essência da vida, sobre a futilidade da sociedade ocidental tão dominada pela imagem e pelo consumo. Fez-me refletir sobre o que verdadeiramente importa.

E não pode deixar de me ocorrer, nestes tempos atípicos e difíceis que vivemos, o quão importante é repensarmos o que verdadeiramente importa. E não tenho a menor dúvida de que o que importa não é ter meias emparelhadas mas pés quentes, que as mãos que temos se dediquem a cuidarmos de nós e dos outros, e que não desperdiçar é muito mais valioso do que ter meias iguais.

Por tudo isto, e também porque os pés dos bebés do Quénia eram bem mais coloridos do que os nossos, venho lançar a todos um desafio para esta quarentena: vamos todos usar mais vezes meias desemparelhadas!     

Catarina Anastácio